As decisões em relação à qualidade do suprimento foram, por muitos anos, baseadas na sensibilidade de engenheiros e técnicos captada a partir de suas experiências. Os resultados eram satisfatórios, pois os sistemas eram comparativamente pequenos e simples. Entretanto, tais sistemas (redes e seus componentes) tornaram-se bem mais complexos e os consumidores mais exigentes. Inclui-se nesta complexidade o processo de re-regulamentação do setor elétrico mundial permitindo a participação de agentes privados. Grandes avanços foram feitos no desenvolvimento de um ambiente que estimulasse a valoração transparente de todos os serviços existentes em um sistema de potência, de modo a criar uma mentalidade competitiva nos agentes participantes. A nova estrutura inclui: empresas de geração, transmissão, distribuição, operador do sistema (e.g. no Brasil, ONS – Operador Nacional do Sistema), mercado (e.g. no Brasil, ex – MAE – Mercado Atacadista de Energia Elétrica, hoje CCEE – Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), agência reguladora, (e.g. no Brasil, ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica) e, se necessário, uma entidade responsável pelo planejamento indicativo (e.g. no Brasil, EPE – Empresa de Pesquisa Energética). A complexidade deste novo ambiente operacional tem exigido dos planejadores, operadores e mantenedores dos sistemas elétricos atuais um nível de conhecimento muito mais abrangente, que dificilmente encontra-se na formação dos engenheiros tradicionais da área e, consequentemente, nas ferramentas clássicas utilizadas. Alguns exemplos são dados a seguir.
As atuais redes elétricas de transmissão vêm sendo utilizadas de forma extremamente intensa, criando uma série de problemas operativos jamais visto no passado (congestion), os quais têm sido responsabilizados, em parte, pelos recentes blackouts experimentados em diversos países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Novas fontes de energia renováveis, muito mais voláteis (e.g. geração eólica), têm sido agregadas aos novos sistemas. Outras fontes menos voláteis, porém cíclicas (e.g. painéis fotovoltaicos), têm requerido novos dispositivos de armazenamento e gerenciamento de sua utilização. Ademais, micro-turbinas, células combustíveis, etc. têm sido também utilizadas, e em sua maioria, agregadas aos sistemas de distribuição. Criam-se então sistemas em que a geração está conectada não somente aos sistemas de transmissão e sub-transmissão, como tradicionalmente era feito no passado, mas também aos sistemas de distribuição (e.g. microgrids). Novos equipamentos de sensoriamento, controle, automação, proteção, etc. vêm sendo cada vez mais utilizados.
Como conseqüência, os modelos e as ferramentas tradicionais de análise (fluxo de potência, estabilidade transitória, curto-circuito, etc.) vêm se tornando ineficientes e insuficientes:
• Ineficientes, tendo em vista a dimensão dos sistemas elétricos atuais, cada vez mais interligados com equipamentos mais complexos, cujos modelos são aproximados ou mesmo desprezados pelos programas computacionais disponíveis. Portanto, as ferramentas tradicionais devem ser adaptadas para ambientes de programação distribuída utilizando clusters, e seus modelos capazes de representar os novos equipamentos de rede (e.g. geradores eólicos, células combustíveis, dispositivos de controle de tensão e fluxos em linhas de transmissão, etc.);
• Insuficientes, visto que novos problemas não somente envolvendo aspectos operacionais (congestion, blackouts, microgrids, etc.), mas também aspectos mercadológicos (valoração de serviços, etc.), precisam ser devidamente resolvidos. Portanto, novas ferramentas computacionais devem ser desenvolvidas para resolver um conjunto de problemas inteiramente novos, já presentes na maioria dos atuais sistemas elétricos (e.g. colapso de tensão; gerenciamento do congestionamento da transmissão; avaliação da confiabilidade – adequação estática, segurança dinâmica, análise preventiva; precificação do uso da transmissão – incentivo ao uso de energias renováveis); tarifação da energia – distribuidores e grandes consumidores; previsão de multas; definição ótima de contratos; e outros que irão aparecer ou se intensificar no futuro (aumento substancial na penetração de energias alternativas – biomassa, eólica, etc.).
Por último, os procedimentos empíricos deverão ser substituídos por outros mais complexos que incorporam ao conceito de qualidade a natureza probabilística do comportamento dos sistemas, da demanda, da falha dos componentes, etc. Modelos matemático-estatísticos mais rigorosos oriundos da teoria das probabilidades e dos conjuntos difusos, processos estocásticos, confiabilidade e de modernas técnicas de otimização, principalmente aquelas capazes de lidar com problemas de alta complexidade (e.g. técnicas baseadas em população – algoritmos evolucionários) deverão formar a base de novas metodologias e ferramentas computacionais de planejamento da expansão (geração, transmissão, etc.), operação (otimização multiobjetivo, etc.), manutenção e de monitoração/controle dos sistemas de potência atuais.
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